A Sierra Nevada é uma empresa familiar de cerveja. O seu slogan, que aparece em cada lata e garrafa, é, “FAMILY OWNED, OPERATED & ARGUED OVER”(“propriedade familiar, operada e discutida pela família”). Ken Grossman, o fundador da Sierra Nevada, diz: “É engraçado, mas é a verdade. Podemos reunir-nos e discutir sobre o que achamos melhor fazer para a empresa avançar, mas todos o fazemos de boa fé, sabendo que todos querem o que é melhor em geral”.
Você pode dizer algo semelhante sobre o seu negócio familiar? Se não pode, você deve estar nesta posição difícil justamente por ter uma cultura de evitar conflitos. Veja, por exemplo, a experiência de uma família no negócio de varejo. Ao longo dos anos, os ânimos começaram a inflar-se – não porque houvesse demasiado desacordo, mas porque se evitavam decisões importantes para não ter que lidar com potenciais conflitos. Por exemplo, enquanto todos os membros da terceira geração trabalhavam na empresa, havia uma grande discrepância nos seus níveis de compromisso e contribuições. Aqueles que trabalhavam com afinco e dedicação para conseguir fazer o seu trabalho começaram a ressentir-se daqueles que apareciam quando queriam, mas a família resistiu a estabelecer quaisquer padrões que pudessem alienar alguém. No final, os líderes do negócio decidiram vender a empresa ao invés de resolver os desentendimentos que ameaçavam perturbar a harmonia familiar durante a transição para a terceira geração. Infelizmente, a venda do negócio não resolveu o problema, uma vez que houveram queixas sobre como os lucros foram divididos e um sentimento, entre muitos, de que tinham desistido do legado familiar com muita facilidade. E sem o negócio para os mantê-los juntos, a família começou a afastar-se. Em poucos anos, muitos membros da família passaram a olhar a venda como um erro. Tanto o negócio quanto as relações estreitas já não existem mais.

Há, contudo, um caminho melhor – aquilo que chamamos de “Zona de conflito da Cachinhos Dourados” , onde os desacordos podem ser construtivamente discutidos e arejados.
Se sua família, assim como esta, se encontra no lado “muito pouco” do espectro do conflito, aqui ficam alguns conselhos para entrar na Zona de conflito da Cachinhos Dourados:
-
-
- Alinhe regras básicas de conduta em reunião para orientar discussões de forma saudável. Como exemplo, veja a tabela “Regras básicas de reunião”. Vocês deverão alinhar estas regras básicas de conduta antes de entrar em discussões importantes. E depois repactuá-las antes de cada reunião. Quando o comportamento de alguém se desviar, use as regras de forma suave para ajudar esta pessoa a voltar a um comportamento aceitável.
- Começe a construir um propósito comum. Conversem sobre o que esperam atingir com o negócio familiar. Isto ajuda a criar as bases para a ação coletiva e para aquilo que querem sacrificar. Pode também articular um “propósito negativo” – identificando os resultados que estão tentando evitar. Utilizem este propósito para ajudar a motivar e a manter a coesão.
- Crie “marolas” para pegar impulso. Muitas vezes a escala da mudança é assustadora, e pode ser valioso ter um pequeno lugar para começar. Normalmente é melhor ser evolucionário do que revolucionário. Com uma família, explorávamos formas de integrar os cônjuges nas estruturas de governança. Houve uma relutância em colocá-los no Conselho de Família, então utilizamos um grupo de trabalho da Próxima Geração para criar um ponto de partida. Certifique-se de trabalhar com as fontes atuais de autoridade, em vez de tentar destroná-las.
- Foque nos princípios e não nas pessoas. Tente evitar tomar decisões tendo em mente determinadas pessoas, uma vez que o posicionamento de cada pessoa será moldado pela forma como serão afetadas pelas decisões. Em vez disso, comece com princípios mais amplos que depois podem ser aplicados a uma situação particular. Tente desenvolver os princípios antes de precisar deles. Por exemplo, é valioso elaborar uma Política de Emprego Familiar (Ver Capítulo 10) muito antes de a próxima geração estar pronta para entrar para a força de trabalho e as pessoas se posicionarem sobre os seus filhos. Se tiver de lidar com uma questão “ao vivo”, tente generalizá-la como um precedente que poderá, em última análise, afetar qualquer pessoa no futuro.
- Construa novas ideias a partir das já existentes. Há muito estudo sobre como as ideias se propagam, e uma das principais conclusões é que novas ideias são mais aceitáveis se forem adicionadas às já existentes em vez de serem vistas como novas em folha. A mudança é difícil para a maioria das famílias, e pode ser mais fácil aceita-la quando é percebida como estando ligada à algo já existente a aceito. Esta é a noção de “enxerto”, de integrar conscientemente a nova ideia no que já está em vigor. Por exemplo, estávamos tentando ajudar uma família a mudar uma das regras estabelecidas pelo seu pai. Foi mais fácil para eles aceitar esta mudança quando conseguiram ligar esta alteração às excepções que ele havia feito anteriormente sobre o mesmo assunto.
- Reforçe o valor do que veio antes. Num processo de mudança, resista à tentação de defender o novo denegrindo o que veio antes, pois tende a criar uma atitude defensiva entre as pessoas que criaram o sistema atual. Em vez disso, comece por identificar por que razão o que existe hoje é inteiramente racional, dado o conjunto de circunstâncias prevalecentes quando as escolhas foram feitas. Depois, aponte para a mudança de circunstâncias que torna essas abordagens já não mais tão viáveis.
-
Ninguém pretende ter conflitos dentro de um negócio – e pior ainda, dentro de uma família. Mas alguns conflitos são de fato saudáveis. Proporciona uma oportunidade para limpar o ar de ressentimentos persistentes e questões potenciais, e talvez até para encontrar um processo de confronto produtivo de ideias ou visões para discordar e tomar melhores decisões. O conflito não tem que destruir uma família – bem gerido, pode tornar os laços ainda mais fortes. Mas quando é permitido ficar remoendo, o caminho para relações irrevogavelmente frágeis pode ser rápido.
*Adaptado do livro Harvard Business Review Family Business Handbook de Josh Baron e Rob Lachenauer. Páginas 221-223.
Resumo: Todos sabemos que conflitos em demasia são um problema em qualquer empresa familiar. Mas nem sempre reconhecemos que muito pouco conflito também pode ser um problema. O conflito é um dilema da “Cachinhos Dourados” – muito e pouco podem levar a resultados igualmente pouco saudáveis para o negócio e para a família. Em vez disso, concentrem-se em ter uma quantidade saudável de conflitos. Para isto, tente experimentar estas estratégias:
-
- Alinhar regras básicas de conduta em reunião
- Construir um propósito comum
- Criar “marolas” para criar impulso
- Focar nos princípios e não nas pessoas
- Construir novas ideias sobre as já existentes
- Reforçe o valor do que veio antes.
O conflito não tem de destruir uma família – bem gerido, pode tornar os laços ainda mais fortes.